Forte abraço, Sacur

Esta manhã ouvi a crónica do Sacur Latibo, transmitida para o Jornal da manhã a partir da Beira. Gostei do facto por duas razões. Primeiro, porque é sempre com muito gozo que me delicio com as crónicas do Sacur às quartas-feiras. Segundo, e esta é a razão de ser desta mensagem, porque mesmo sendo delegado da Rádio Moçambique agora num Emissor Provincial de maior complexidade, ele mantém o cultivo da crónica. Coisa rara entre nós - onde a cultura dominante é ganhar-se o gestor e quase sempre se perder o técnico, se assassinar o artista. Forte abraço, Sacur.

Inovar, inovar, inovar


Lançou-se no mercado com os famosos rolos de papel higiénico de côr preta e o público da Europa, dos Estados Unidos e do Japão aderiu à moda. Depois, foi só a Renova passar a colorir os rolos consoante as recomendações dos estudos de mercado, sempre usando papel de texturas suaves. Na última edição da revista Exame, Paulo Pereira da Silva, o líder da empresa, surpreendeu-me com o desafio que agora se faz a si mesmo: por que não papel higiénico transparente?

Chissano ou Guebuza?

No telejornal da noite do último sábado, eu ouvi a apresentadora Hermínia Machel a oferecer-nos um novo Presidente da República de visita a Nampula: Joaquim Armando Guebuza! O lapso é humano. Mas tornou-se uma nódoa profissional por a coisa ter ficado sem emenda ao longo de todo o serviço noticioso da Televisão de Moçambique naquele dia.

34 anos depois


Abro o correio esta manhã e vejo uma mensagem curta da Isaura Ibraimo. Dá-me conta da chegada a Maputo, amanhã, sábado, dia 26, no vôo da TAP, de José Rodrigues dos Santos, o conhecido jornalista e escritor cujo boneco no "Contra Informação" tem as orelhas bem pronunciadas. Embora nascido na Beira, foi a cidade de Tete que o acolheu ainda bebé. É por isso, se calhar, que a malta ribeirinha lhe fará todas as honras da casa, com João Schwalbach a encabeçar a matutina recepção no Aeroporto Internacional de Maputo (à qual todos os interessados estão desde já convidados a juntar-se). A entrada é livre para o jantar no mesmo dia no restaurante da Costa do Sol, cada conviva pagando a sua conta. Só duvido que Isaías Marrão embarque nesta coisa do onde-comem-dois-comem-três, estendendo, por exemplo, a oferta da hospedagem em sua casa em Tete a outras pessoas interessadas que não somente a esposa do visitante. Para já, é isto. O resto virá na imprensa, acho eu.

Estranha coincidência

Não sei o que se passa com a Oposição em Moçambique.
Tirando um ou outro raro momento de inspiração jurídica, no geral ela não tem um Governo-sombra que se pronuncie sobre os pelouros pertinentes, não produz ideias, não parece ter capacidade de gerar um programa alternativo.
Nas autarquias onde é Oposição, também a Frelimo entra surpreendentemente para o mesmo saco. Quer dizer, não tem um Governo-sombra que se pronuncie sobre os pelouros pertinentes, não produz ideias, não parece ter capacidade de gerar um programa alternativo.
São escalas diferentes, é verdade. Mas não deixa de ser curioso que neste pormenor os dois maiores partidos de Moçambique sejam muito parecidos.
Estranhamente, muito parecidos.

Para lidar com a crise

1º Elevar a produtividade agrícola e pecuária que envolve mais de 80% da população (...)

2º Elevar a competitividade das micro, pequenas e médias empresas moçambicanas que empregam centenas de milhares de trabalhadores e familiares com o objectivo de substituir as importações e exportar;

3º Generalizar o ensino técnico e profissional para possibilitar conhecimentos de base tecnológica e de gestão direcionados para o mercado e o saber fazer que facilite o auto-emprego(...)

Prakash Ratilal, excerto de “Moçambique: Reflexões sobre o Crescimento e Sustentabilidade”

Africa Works


O músico Youssou N´dour fundou uma instituição de micro-finanças chamada Birima, nome de um antigo rei do Senegal que se tornou famoso por honrar a palavra. A empresa de N´dour acaba de embarcar numa campanha com o Grupo italiano Benetton, com a duração de três a quatro meses, sob o lema “Africa Works”, orçada em 10 milhões de Euros.
Saída este mês na revista Marketeer, esta nova atraiu a minha atenção por duas razões. Primeiro, mostra-nos como uma certa classe de músicos lida com os negócios da vida e, segundo, ensina a muitos gestores cá da terra que as campanhas de publicidade são sempre suportadas por um orçamento, grande ou pequeno.

RM 2 - TVM 0

A partir da África do Sul, o jornalista João de Sousa tem estado a brindar-nos diariamente com um excelente lote de despachos que enriquecem os serviços noticiosos da Antena Nacional da Rádio Moçambique. Com a recente nomeação de Faustino Igreja para correspondente no Malawi, eleva-se para dois o número de correspondentes que aquela estação de rádio tem na África Austral. Não se trata propriamente de um jogo, mas não resisto à tentação de afirmar que a Rádio Moçambique já está a ganhar à Televisão de Moçambique por dois a zero.

Mugabe


O meu filho aprendeu na escola que seis países fazem fronteira com Moçambique, entre os quais o Zimbabwe.
- Mas por que é que ultimamente se fala tanto do Zimbabwe, papá?
Não tinha à mão uma fórmula para lhe enfiar numa ou duas frases simples a crise de governação em que o país vizinho está mergulhado, os velhos problemas da terra, o demónio britânico, o esquisito processo eleitoral, a desgraçada postura da SADC.
- Há meninos que têm bolas de futebol, tu sabes.
Ele disse que sim com a cabeça.
- Alguns deles não sabem perder, meu filho.
O puto fez uma careta e ficou na expectativa. Não disse que sim nem disse que não.
- Ao perderem, eles vão para casa com a bola e assim dão cabo do torneio.
- É verdade.
- Foi mais ou menos isso que fez o senhor Robert Mugabe ao saber que o povo não ia escolhê-lo de novo para presidente do Zimbabwe.
- Mas isso é batota, papá. Os presidentes também fazem batota?
- Nem todos, mas fazem.

Fingi não estar a ver que ele digeria mal a informação.
- O nosso também é batoteiro?
Ser pai também passa por meter a conversa por esses atalhos. Tive de dar a minha opinião sincera sobre o nosso presidente.

Fernando Ganhão (1937-2008)


Poema
O comboio que vem com as lúcidas nortadas
corta o veludo negro do cacimbo
e os homens nos vagões sabem a sangue
despertam as moscas de seu longo Inverno.
Os homens nos vagões
com a saudade errada de um sabor que paira
um sabor de canho e mágoa
O comboio que vem com as nortadas
derrama na savana
o leite azedo
o leite espesso
o leite antigo de uma saudade de homens nos vagões
A saudade dos homens nos vagões
é cólera, revolta e dor.
O comboio que volta durante as nortadas
fere o cacimbo da savana
com o gemido dos homens nos vagões.


Fernando Ganhão

Azagaia & Salimo Mohamed

Por mero acaso, sintonizei uma estação de rádio que passava uma voz parecida com a do Salimo Mohamed. Detive-me por uns instantes e de facto acabava de entrar em sintonia com uma animada entrevista do músico Salimo Mohamed. Pus-me a ouvir a conversa que se estendeu por cerca de hora e meia, onde contou a sua ida a pé de Maputo até Gazankulo, a sua admiração por Chico António, José Mucavele e, dentre outros, por João Cabaço, a amizade que travou em Portugal com José Cid e o seu inesquecível conselho - canta na tua língua, Simião!”. Na altura, Salimo Mohamed chamava-se Simião Mazuze e gostava de cantar na língua dos outros. Na entrevista, Salimo Mohamed tambem se definiu como um homem que gosta de aprender, mas diz não entender por que os políticos se põem a mexer no hino nacional. “Devia haver mais respeito”, afirma. A dada altura, o jornalista quer saber o que Salimo pensava de Azagaia? Achei a resposta bastante original. “O Azagaia? Gosto dele”, disse. “É um declamador muito bom, que sabe aflorar os problemas do povo!" Com esta, eu nao contava. Um remate mesmo a Salimo Mohamed.

100 Crítica

Olá, vedeta das letras, dizia o sms da Tina Mucavele. Os 100 Crítica precisam de ti para uma orgia de poesia, melodia e geografia dos sentidos, dia 10 de Abril às 19 h no Bar do Sheik, Av. Mao Tse Tung, esquina com Julius Nyerere. Não mais no Franco como havia sido publicitado. Entrada... é mahala! Mesmo verdade isso! 100 Crítica neste show são: Sininho Paco, Sheila Jesuita, Stewart Sukuma e Tina Mucavele. Convidados: Lena, Muzila, Cheny, Stelio e Naido.
Gostei do conceito do espectáculo. Muito relaxado, informal, bem preparado, esteticamente conseguido. No fim, ainda houve lugar para os presentes fazerem anuncios dos seus eventos. Muita liberdade, no bom sentido do termo. Liberdade e responsabilidade, claro. Surpreendentemente, por lá fiquei melhor informado sobre o estado da nação. (Os informes que são feitos no Parlamento apanharam um grande bigode quer na forma como no conteúdo!) Gostei de ver a Lena a cantar, a Tina a declamar, o Stewart a dedilhar a viola e o Sininho abanando o país da marrabenta com a sua demolidora declamação. Mas havia muito mais: a timbila, o batuque, as palmas, a cumplicidade dos olhares, os reencontros, os abraços, etc. E o bar, claro. Aqui ficam as minhas palmas para os 100 Crítica.

Chika Onyeani em Maputo


Afinal não é um produto do dia das mentiras. O autor de Capitalist Nigger, o nigeriano Chika Onyeani estará mesmo em Maputo para duas conferencias nos dias 16 e 17 deste mês. Há uns anos, deu que falar na África do Sul onde ainda parecia haver algumas dúvidas sobre a diferença entre a classe média negra e a classe média branca. “É simples”, disse ele. “Se os membros da classe média negra ficam sem o seu cheque mensal de pagamento, regressam de imediato para a classe dos pobres”. Ulalá! Que cartas o conferencista traz na manga para a plateia de Maputo? Até agora, nada veio cá para fora. Só nos resta, portanto, estar atentos aos jornais.

Emissão de bilhetes de identidade depende de doadores?!

Acabo de saber que a incapacidade do Estado moçambicano de disponibilizar aos seus cidadãos os bilhetes de identidade a tempo e horas não tem os dias contados. Pela entrevista concedida ao jornal Zambeze por Gabriel Machado, director da Unidade Técnica para a Reforma do Sector Público (UTRESP) fica-se a saber que a solução do problema passa por Moçambique estender de novo a mão à comunidade internacional. Para a fase inicial, são necessários três milhões de dólares americanos. O entrevistado estima que, para o processo todo, as despesas cheguem a 20 milhões de dólares americanos. Até que a filantropia estrangeira comece a dar frutos, os moçambicanos vão sendo maltratados nos bancos, nos serviços de registo e notariado, na obtenção de licenças, etc.

O nome do teu ombro

(Dedico este poema a uma mulher especial que sabe perfeitamente que Kama-sutra é muito mais do que umas tantas posições para o ano todo e uma nova marca de preservativos.)

De repente
uma fenda se ajoelha no gemido da rocha


Entre a seda dos nossos templos de medo
dos nossos juramentos
ao peso do carimbo vergados
esta carícia dos caracóis
atravessando o porto das manhãs


Estremeço

Nos idílios da Catembe
somente uma tabuleta com letras de cacimba
na doca
incrustado num gomo de lua
o nome do teu ombro


Abrigas-me do granizo
da fome
da sede que tenho das tuas lianas


Aprendo a tecer a minha sombra
no ciúme da brisa
as velas excitadas pela nortada
a ansiedade índia das âncoras
os mamilos da tua timbila bem chope


E no aroma do teu silêncio, amor
uma pauta
uma escrita na língua das flores
ou um velho cântico de pingos tamborilando
tamborilando
tamborilando os seus dedos
no secreto telhado dos nossos desejos.


Daniel da Costa